terça-feira, maio 24, 2005

O exílio do imaginário

“No luto real, é a “prova de realidade” que me mostra que o objeto amado não existe mais. No luto amoroso o objeto não está morto, nem distante. Sou eu quem decido que a sua imagem deve morrer (e ele talvez nem saberá disso). Durante todo o tempo de duração desse estranho luto, terei que suportar duas infelicidades contrárias: sofrer com a presença do outro (continuando a me ferir à sua revelia) e ficar triste com a sua morte (pelo menos tal como eu o amava). Assim me angustio (velho hábito) por causa de um telefone que não toca, mas ao mesmo tempo devo me dizer que esse silêncio é de qualquer jeito inconseqüente, porque decidi elaborar o luto dessa preocupação: é a imagem amorosa que deve me telefonar; desaparecida essa imagem, o telefone, toque ou não, retoma sua existência fútil.
Quanto mais eu fracasso no luto da imagem, mais fico angustiado; mas, quanto mais eu consigo, mais me entristeço. Se o exílio do Imaginário é o caminho necessário para a “cura”, convenhamos que o progresso é triste. Essa tristeza não é uma melancolia, pois não me acuso de nada e não fico prostrado. Minha tristeza pertence a essa faixa de melancolia onde a perda do ser amado fica abstrata. Falta redobrada: não posso nem mesmo investir minha infelicidade, como no tempo em que eu sofria por estar apaixonado. Nesse tempo, eu desejava, eu sonhava, eu lutava; diante de mim havia um bem, apenas retardado, atravessado por contratempos. Agora, não há mais repercussão; tudo está calmo e é pior. Embora justificado por uma economia - a imagem morre para que eu viva – o luto amoroso tem sempre um resto: uma palavra volta sem parar: Que pena!
Fragmentos de Um Discurso Amoroso